DEMOKRISIS

A CRISE DA DEMOCRACIA

Monday, February 28, 2005

GALILEU GALILEI

Eu,
Galileu Galilei
Sei
Sei muito bem
Que a terra se move
Mas não pretendo por tão pouco
Ser estorvo
Muito menos estorvado
Pelos fanáticos da imobilidade
O movimento
Não depende deles nem de mim
Mas se para viver mais alguns dias for preciso
Direi que sim
Que o universo todo é uma grande pasmaceira
Um simples grão de areia
Comparado às praias da lucidez
Das suas laureadas mentes
Antes isso que julgado
E em mim queimada
Esta energia que me aquece o corpo
Não é por isso que a terra vai parar
Continuará sempre a girar e nós com ela
E um dia para além de mim
Alguém me vingará
E proclamará com um riso nos lábios
Muito mal faz o sonho a quem não sonha e vive
Embalsamado em torreões impantes
Intransponíveis
Sem portas nem janelas
Sem um raio de sol a passar por elas
E a quem no escuro impenetrável
Esbraceja
Corta asas
Proíbe viagens
Estrangula vidas e sonhos
E no entanto
Para lá das grades
Para lá dos ferros
Para lá da morte
Para lá das trevas
O sonho, a vida a terra
Continuam a mover-se

André Moa

Monday, February 21, 2005

SÃO ROSAS, SENHOR, SÃO ROSAS

Bom dia, caros amigos leitores e comentaristas! Neste primeiro dia do resto da nossa vida, permitam que una a minha voz à voz da nossa querida jovem comentarista Ana Catarina que já aqui deixou expresso o grito da esperança que é a sua e a de todo o país. Este pobre e triste Portugal renasceu e transformou-se, de repente, num roseiral florido, com duas "ilhas" adjacentes e alaranjadas: a Madeira e Leiria. Este novo perfume não nos deve dividir, inibriar, embebedar ou assoberbar, mas antes regozijar e unir no essencial, sem prejuizo da diversidade desde que defendida com nobreza de carácter e verticalidade. Foi, em meu entender, o que faltou (e faltará sempre, pois que ninguém pode dar aquilo que não tem) à dupla Portas-Santana, acolitados pelos Pòrtistas e Santanistas, que até o diabo tem os seus veneradores. Em democracia não há (não deve haver) nem vencedores nem vencidos, mas tão somente mudança de rumo, de orientação, de objectivos que a todos devem entusiasmar e responsabilizar para bem de Portugal. É a união e não a divisão que faz a força. E todos somos poucos para as muitas e árduas tarefas a realizar.
Este blogue ganhou, terá que ganhar, novo folgo e redobrar de atenção e aturada reflexão. Passada esta euforia, enterrados os pequenos ou grandes excessos da refrega eleitoral, há que estar atento e contribuir para que o roseiral dê rosas que regalem o olho e consolem a alma, que as flores da esperança não murchem e se transformem em pão para todos, em bodo de bem-estar e progresso. Que sob a aparência de rosas se esconda o manjar colectivo por que todos suspiramos. Alegremo-nos e rejubilemos. Arregacemos as mangas e mãos à obra, que a tarefa é de todos e deverá ser feita por todos, para bem de todos. Pois não é esta a essência da democracia?
Um abraço amigo
André Moa

Friday, February 18, 2005

O SISTEMA ANTI-SISTEMA

2.ª parte

Na 1.ª parte desta reflexão sobre o sistema – “O Sistema Constitucional” - apresentei, sumariamente embora, o sistema resultante da Lei Fundamental do país: o governo não é eleito, responde perante os órgãos eleitos (Presidente e Assembleia da República), sendo por eles escolhido, nomeado e fiscalizado, em resultado das eleições e da composição da Assembleia da República eleita pela vontade popular livremente expressa nas urnas.
Terminei com a afirmação de que, infelizmente, bastará estar minimamente atento às eleições em curso para se verificar à saciedade que as coisas não se passam deste modo, que o sistema está distorcido.
Vejamos então: em primeiro lugar o como; em segundo lugar o porquê. Finalmente, e uma vez feito o diagnóstico, adiantaremos a terapia que consideramos adequada e imprescindível.
Numa campanha para a eleição dos 230 deputados que darão corpo à Assembleia da República, que percentagem de eleitores conhecerá os candidatos? Eu arrisco a percentagem subjectiva e ínfima de 0,5%, se exceptuarmos a meia dúzia dos nomes sonantes que encabeçam as listas dos vários círculos eleitorais. E isto porquê? Por culpa de quê e de quem?
Assistimos a uma campanha eleitoral centrada em dois galos que lutam encarniçadamente (vale tudo, até o insulto) pelo poleiro, pelo lugar de Primeiro-Ministro, mais ou menos acolitados, mais ou menos bicados por uns tantos garnisés. E prometem este mundo e o outro, quando as grandes directrizes, as grandes normas, as grandes orientações, as necessárias mudanças estruturais dependem da Assembleia da República a eleger e à qual o Governo, qualquer que ele seja, deve (deveria dever) obediência.
E a figura de Primeiro Ministro, que deveria surgir apenas na sequência do resultado das eleições e da futura composição da Assembleia da República, e a nomear pelo Presidente da República, ouvidos os partidos políticos com assento parlamentar, surge ainda antes da campanha e durante a campanha de forma despudorada, como a personagem principal, central, absorvente de todo este desvirtuamento constitucional que nos vai impor (impor, digo bem) um manda-chuva, cabeça de cartaz de uma oligarquia a que chamamos partido político. Ao povo, a quem constitucionalmente cabe a soberania e o exercício do poder político, pouco ou nada restará, senão, qual Egas Moniz com a corda ao pescoço devido ao mau carácter de outrém, de quando em quando apresentar-se perante as urnas onde enterra, aliena a força democrática que seria a sua, se a pudesse utilizar devidamente, e apor uma cruz à frente do nome da oligarquia (do partido político) que baralhou, partiu, viciou as cartas do jogo.
Estou com isto a apelar ao voto em branco ou nulo? Claro que não. Seria pior a emenda que o soneto. Votar, isto é, escolher entre as duas oligarquias que se apresentam a terreiro, impondo-nos a sopa que cozinharam, sempre nos permitirá ficar com o menor dos males. Mas que isto está distorcido, perigosamente distorcido, está. Porquê?
É o que veremos num próximo capítulo, já que me recomendam que umas das regras num blogue é fazer textos curtos. Textos curtos não consigo fazer, até porque seriam incompatíveis com a seriedade dos temas que aqui me proponho escalpelizar. Mas que, ao menos, não sejam extensos em demasia. Façamo-lo e publiquêmo-lo, pois, em fascículos, para não cansar tanto os leitores e melhor lhes atrair a sua indispensável e respeitável atenção.
E, já agora, boa votação.
(continua)

Monday, February 14, 2005

LÚCIA MORREU. A POLÍTICA TAMBÉM?

Lúcia morreu. Muito nova, coitada! Contava apenas 97 anos e 11 meses. Muito pouco tempo para quem viveu quase todo o tempo enclausurada. De vida normal teve apenas os primeiros 10 anos, e neles sofreu as agruras da pobreza, do baixo nível sócio-cultural em que nasceu, dos costumados e por vezes nefastos medos infantis: almas penadas a espreitar por detrás de cada penedo, ralhos celestes transformados em trovões, raios e coriscos e outros fenómenos naturais racionalmente incompreensíveis para quem crescia num ambiente rude, crente e inculto. Se tais fenómenos a surpreendiam no alto da serra onde guardava o parco rebanho da família, o pavor logo os transformava em insondáveis mistérios, visões, alucinações, interpretações delirantes que comungava com os seus primos mais novos.
Lúcia morreu. Vai nascer um novo mito, que a igreja não perde nenhuma oportunidade para criar ícones que sirvam de engodo para a pesca das pobres almas supersticiosas. Por isso, não tardará que seja beatificada e, logo, logo, santificada.
Se isto se passasse no cada vez mais restrito campo religioso, eclesiástico, o assunto não me mereceria sequer esta meia dúzia de linhas.
O inaceitável é ver os representantes de um país, constitucionalmente independente e laico, vergado à morte da quase centenária “vidente” de Fátima.
Santana Lopes e Paulo Portas, para quem a política não passa de uma permanente feira das suas vaidades, interromperam de imediato as acções da campanha eleitoral; o PS, mais comedido, interrompeu as acções de rua, as manifestações de festa; O BE e a CDU mostraram-se, parcimoniosamente condolentes. E eu pergunto: que pecados terão cometido, que maldades estariam a tramar Santana e Portas para, perante a morte, se ajoelharem, se mostrarem subitamente arrependidos? Que consideração lhes merece uma campanha eleitoral, para a interromperem assim? Uma campanha eleitoral é tão só um carnaval que choque com a morte de alguém? A política é ou não é uma coisa séria? Importa mais ser honesto, consciente, pedagogo ou hipócrita, fariseu, demagogo, sepulcro caiado por fora e pútrido por dentro?
Enterrem-se os mortos com o devido respeito, mas tratem-se os vivos com o necessário empenhamento, com o não menos devido respeito, com a indispensável atenção, estima e consideração.

Friday, February 11, 2005

O SISTEMA CONSTITUCIONAL

1ª PARTE
Antes de gritar com toda a energia acumulada ao longo dos anos (dos carnavais eleitorais, se preferirem): abaixo o sistema anti-sistema, há que trazer para a luz desta ribalta, de forma necessariamente sintética, o sistema contemplado na Constituição da República Portuguesa. Só depois de enaltecermos este, estaremos em condições de rebaixar o sistema anti-sistema, o sistema da República das Bananas em que pouco a pouco nos fomos transformando. E continua. E está a agravar-se cada vez mais. E não é por pessimismo que o afirmo. Quem quer que saiba pensar o pode verificar.
Pela Constituição da República Portuguesa, “a soberania reside no povo” (art.º 3.º,1). O povo “exerce o poder político através do sufrágio universal, igual, directo, secreto e periódico, do referendo e das demais formas previstas na Constituição” (art.º 10.º). O exercício do direito de sufrágio é pessoal e constitui um dever cívico (art.º 49.º,2). “O poder político pertence ao povo e é exercido nos termos da Constituição” (art.º 108.º). “Os órgãos de soberania devem observar a separação e a interdependência estabelecidas na Constituição” (art.º 111.º,1). “A Assembleia da República é a assembleia representativa de todos os cidadãos portugueses” (art.º 147.º). “Compete à assembleia da República” (para além do mais): “vigiar pelo cumprimento da Constituição e das leis e apreciar os actos do Governo e da Administração” (art.º 162.º, a); “apreciar o programa do Governo (art.º 163.º, d); ”votar moções de confiança e de censura ao Governo” (art.º 163, e).
O Governo, que é o órgão de condução da política geral do país e o órgão superior da Administração Pública (art.º 182.º), é constituído pelo Primeiro-Ministro, pelos Ministros e pelos Secretários e Subsecretários de Estado (art.º 183.º,1) é nomeado pelo Presidente da República, a começar pelo Primeiro-Ministro que é nomeado, ouvidos os partidos representados na Assembleia da República e tendo em conta os resultados eleitorais (art.º 187.º, 1.). Como corolário disto, o art.º 190.º da Constituição dispõe que “O Governo é responsável perante o Presidente da República e a Assembleia da República”.
A rejeição do programa do Governo, a não aprovação de uma moção de confiança, a aprovação de uma moção de censura por maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções, implicam a demissão do Governo (art.º 195.º, n.º 1, alíneas d), e) e f), respectivamente).
Saindo da secura dos números e das transcrições, podemos, em síntese, dizer que o Governo é, de entre órgãos da soberania, (olvidemos, por ora, os Tribunais) o mais interdependente. O Governo está (deveria estar) durante o seu normal funcionamento sempre sob vigilância da Assembleia da República e sob a constante e aturada observação do Presidente da República a quem cabe assegurar o regular funcionamento das instituições democráticas. Isto está claramente contemplado na Constituição e forma um todo harmónico que, não fosse ele desvirtuado, nos livraria de sobressaltos, garantiria a necessária estabilidade e o normal funcionamento das instituições.
O povo, residência da soberania, no exercício do poder político, elege, por sufrágio directo e universal, a Assembleia da República e o Presidente da República. O Governo não é eleito, responde perante os órgãos eleitos, é escolhido, nomeado e vigiado, nos termos previstos na constituição, em resultado das eleições e da composição da Assembleia da República resultante da votação popular.
Isto é o que resulta dos vários preceitos constitucionais que versam sobre o assunto. E se assim fosse, haveria menos convulsões. Infelizmente, bastará estar minimamente atento às eleições em curso, para se verificar que as coisas não se passam deste modo, que o sistema está distorcido. Nefastamente distorcido, em meu entender. Como e porquê? O assunto é sério, não pode passar-se por cima dele como gato por brasas, pelo que necessita de próximos capítulos, de mais spots Até ao próximo.
Com um abraço para todos os comentaristas e leitores.
André Moa

(continua)

Wednesday, February 09, 2005

QUARESMA

Foi-se o carnaval, vem a quaresma, o tempo da moderação. Desejamos que sim, sabemos que não. O carnaval que já dura há pelo menos seis meses, vai continuar até à tomada de posse do próximo governo, se houver mudança. Caso contrário, a dança carnavalesca continuaria, pelo menos em teoria, por mais quatro anos. Quanto mais não seja, com as palhaçadas do Santama, de falcon ou de cadeirão em São Bento, a carnavalar em família, com os amigos jornalistas que estão dispostos a tudo. Será que perdeu toda a coragem que não passou nunca de fanfarronice) para enfrentar o público? Será que os comícios lhe estão a correr assim tão mal que o deixaram descoroçoado? Ou foi receita de "médico" amigo?
Sabia que a santinha madrezinha igrejinha catolicazinha, nos tempos em que impava de poder temporal, chegou a impor continência total durante toda a quaresma mesmo aos casais unidos pela "santo sacramento do matrimónio"? Pois foi. O Prof. Júlio Machado Vaz ainda esta manhã no-lo recordou, no seu produndo e bem humorado programa matinal "o amor é..." ao ler tão estapafúrdia prescrição.
Porque a quaresma sempre obriga a alguma moderação (a tradição, mesmo a perversa, ainda tem muita força) hoje fico-me por este contido contributo:

O PÁSSARO DO AMOR

Pássaro vívido teu corpo adeja no meu sonho
e logo este tempo sonolento se transforma
num suave marulhar de anseios.
Líquida refulgência tuas asas fundem-se nas minhas.
Os nossos corpos assim alados
asa com asa o mesmo palpitar
no conjugado esforço de voar
riscam rotas traçam rumos justapostos.
Súbito em nós tudo se confunde somos
um só pássaro um só rumo o mesmo voo
pensamento sentimento e acto
conjugação a dois do verbo amar
unidade vital do nosso ser em festa.
Contigo alcanço o êxtase do voo
cada abraço atinge a leveza do pássaro
e logo toda a mágoa se desfaz em água
e a lágrima em rio e o rio em barco
e o barco em sorriso cascata luminosa
onde a vida se banha para ser
cristalino e renovado amanhecer.


André Moa

Tuesday, February 08, 2005

E SUBITAMENTE UM GRITO!

A NOSSA PÁTRIA É A TERRA

SOU NEM GREGO NEM TROIANO
NEM COVARDE NEM TIRANO
NEM CELTA NEM LUSITANO
NEM PORTUGUÊS NEM HISPANO
NEM MOURISCO NEM ROMANO
NEM HEBREU NEM ARIANO
NEM ÍNDIO NEM AFRICANO
NEM EUROPEU NEM MONGOL
SOU COMO TU SER HUMANO
LADO A LADO MANO A MANO
FRUTOS DA MESMA RAÍZ
CIDADÃOS DE UM SÓ PAÍS
NÓS SOMOS A HUMANIDADE
A CONSTRUIR A IGUALDADE
EM AMOR EM UNIDADE
COM A LUZ DO MESMO SOL

André Moa

Monday, February 07, 2005

PREGADOR DA BOA NOVA????

O padre Lereno acaba de prestar um péssimo “serviço” à Igreja e ao país. Usando o púlpito e a antena 1 da RDP que estava a transmitir a Missa por ele presidida, para propaganda político partidária (mostrou-se um autêntico cacique dos partidos da direita), o padre Lereno “esqueceu-se” de duas máximas:
A máxima constitucional que proclama a separação do estado de qualquer igreja;
A máxima cristã que proclama que se dê a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.
Com isto, o padre Lereno olvidou as Bem-Aventuranças, a essência da Boa-Nova – a libertação dos pobres e oprimidos - a sagacidade de Jesus que mandou atirar a primeira pedra a quem estivesse puro de coração. O padre Lereno usou o púlpito para fazer política baixa , incentivando, directamente e quase explicitamente, a votar nos partidos mais conservadores e reaccionários do espectro político nacional, o partido onde se albergam os ricos, os inimigos dos pobres e oprimidos, os tais que nunca alcançarão o reino dos céus, já que é mais fácil um camelo entrar pelo fundo de uma agulha do que eles abandonarem o seu egoísmo, o seu individualismo, a sua soberba, o seu desdém por quem não tem vintém. O padre Lereno está nos antípodas da Igreja progressista e de cariz humanista que porfiadamente, na senda do que Jesus ensinou, se esforça por ser o sal da terra, Igreja de que é lídimo representante, entre muitos outros, o Frei Bento Domingos que, no mesmo dia em que o padre Lereno se afastou do Evangelho, num jornal diário lembrava que todos devemos estar implicados na procura do bem comum, na luta contra a pobreza, prioridade das prioridades em Portugal, onde “cresce o abismo entre ricos e pobres”.
O padre Lereno, para além de ter aproveitado o púlpito para desviar as atenções do essencial, falou do acessório, em proveito dos partidos que defendem políticas que levaram e continuarão a levar (se continuarem, e sempre que estejam no poder, pois que lhes está ma massa do sangue) ao crescimento do abismo entre os ricos e os pobres.
O padre Lereno enxovalhou a sua missão, ao manifestar que possui um coração mais de propagandista partidário do que de pregador da Boa Nova.

Saturday, February 05, 2005

LUSOFONIA

LÍNGUA LUSA LÍNGUA LUZ
FAROL DE MUNDOS A HAVER
LÍNGUA MAR LÍNGUA MÁGOA E ALEGRIA
LÍNGUA AFECTO BENQUERENÇA E SAUDADE
ARCO-ÍRIS DE EMOÇÕES
ESTRUTURANTE AFAGO MESA E BERÇO
SANGUE COMUM A PULSAR EM PROSA E VERSO

POLICROMÁTICA CULTURA DOCE E AGRESTE
COM MIMOS DE CIDADE E ROBUSTEZ CAMPESTRE

LÍNGUA LUSA LÍNGUA NOSSA LÍNGUA ABRAÇO
LÍNGUA DE CHEGADAS E PARTIDAS
DE REPOUSOS E CANSAÇOS
DE SONHADAS NOITES ESFORÇADOS DIAS
CALOROSO ENCONTRO PRANTEADO ADEUS

CULTURA TEMPERADA POR CALOR DE MUITOS SÓIS
SUAVIDADE PRATEADA POR MIL LUAS
BAPTISMO DE ÁGUA E SANGUE E FOGO E SAL

LÍNGUA-CULTURA EXALTAÇÃO ATLÂNTICA
FLORAÇÃO TROPICAL REQUEBRO AFRICANO
ÍNDICO AROMA ASIÁTICO SABOR
ÍNDIA PLUMA BRASÍLICO FULGOR

CULTURA DE ANDANÇAS E PARAGENS
GAIVOTA ESVOAÇANTE VELA E NAVIO
CONTINENTE E OCEANO LÁGRIMA E RISO

LÍNGUA-CULTURA DO PORVIR
CORPO E ALMA DESTE UNIVERSO SEM FIM
ONDE TODOS SOMOS ONDA DE UM SÓ MAR
FRUTOS DO MESMO POMAR
FLORES PLURAIS DE UM SÓ JARDIM

LUSOFONIA LUZ FONEMA E COR
LUSOFONIA SINFONIA DE AMOR


André Moa

Friday, February 04, 2005

O SISTEMA

meio a sério...

Dia sim, dia não, os profetas da desgraça sobem à tribuna dos modernos areópagos da política nacional (os meios de comunicação social) e dão em desancar no sistema. Que o mal está no sistema, que nada de bom acontecerá em Portugal, enquanto se não mudar o sistema...
Durante algum tempo, dei em sentir-me incomodado com os ditirambos contra o sistema, já que, desde 1976, me habituei a simpatizar com o sistema constitucional português. E ainda hoje simpatizo, apesar dos maus tratos que a constituição já sofreu às mãos dos seus detractores, com o beneplácito de muitos que dizem respeitá-la e solenemente se obrigam a cumpri-la.
Atacam o sistema de que beneficiam, já que todos eles vão vivendo, com privilégios redobrados, à custa do sistema que acusam e maldizem.
O sistema é a raiz de todos os males, proclamam.
Mandaria o mínimo de coerência e de decência que quem ataca frontalmente o sistema e o quer transformar deveria antes de mais sair dele, demarcar-se, pôr-se à margem, para então depois o denunciar com todas as fímbrias do seu ser. Não é isso que se passa. Basta lembrar os Joões da Madeira, os Santanas da Figueira e arredores, e tantos outros apaniguados discípulos da velha e matreira ratice que os leva a saborear o queijo, lambuzarem-se todos com ele, ao mesmo tempo que o roem e corroem por dentro, desdenhando do leite - substracto do tão apetecido, cobiçado e tasquinhado repasto – de que se amamentam.
Que o mal é do sistema, é. Vou tentar demonstrá-lo, a partir desta coisa comezinha a que chamamos eleições, um dos pilares do sistema constitucional.
Bastará analisar este carnaval eleitoral antecipado, cognominado de campanha pré-eleitoral, para não podermos fugir à evidência: a culpa é do sistema.
- É mesmo? – interrogo-me eu, ainda titubeante.
- É mesmo. - afirmo eu, após aturada reflexão, convicto.
- Mas então...
- Mas então o quê? Claro que a culpa é do sistema vigente (do contra –sistema, se preferirem) que os do contra-o-sistema forjaram, implantaram e religiosamente prosseguem, a partir, mas ao arrepio, do sistema legal.
- Então, abaixo o sistema!
- Então, abaixo! Abaixo o sistema anti-sistema. Abaixo o sistema anticonstitucional! (continua)
(Vou aproveitar esta pausa do carnaval para aprofundar, fundamentar e escrevinhar a continuação deste texto. Bom entrudo, que o carnaval, o tal, o eleitoral, está mau. É carnaval a mais. Pelo menos para o meu gosto).

meio a rir...

nos tempos que correm
os maus candidatos
ou “matam” ou “morrem”
tais os desacatos


para atingir os fins
não vêem escolhos
valem os ruins...
até tirar olhos

lavam roupa suja
a própria e a alheia
baba tão sabuja!
Não vão p’rá cadeia?

Lutam pela vida,
coitados! Que quer!?
Se saem da lida
que irão fazer?

Nasceram p’ra isto,
prá porca política...
acima de Cristo
e de qualquer crítica.

Fartar, é fartar,
ó vil vilanagem!
já está a andar,
lutai pela vida,
mais uma corrida,
mais uma viagem!


ELEIÇÕES À VISTA

Meio a sério...


ELEIÇÕES À VISTA

Há acontecimentos, coisas, situações, tempos, ocasiões de que não guardo saudades nenhumas. Um desses tempos é o tempo em que não havia eleições livres.
Agora, há quem considere motivo de instabilidade haver eleições para, livremente, baralhar e dar de novo, dar ao povo ao menos a ilusão de que é ele quem mais ordena, que nele reside a soberania, que é ele o detentor do poder, que é sua a última palavra, como reza a Constituição.
Quando as coisas não estão a correr bem, quando há crispações na sociedade, quando os órgãos da soberania (representantes do povo e que em nome do povo e para o povo deveriam exercer o poder) não se entendem, nada melhor do que marcar eleições para que o povo vote e assim a situação de crise se ultrapasse e a vida social retome os carris da recta intenção, da clarificação, e tudo prossiga em paz e harmonia para bem do povo. Se assim fosse, não seria mau.
Quando tudo corre sobre rodas, apesar dos solavancos de percurso que sempre os haverá, então as eleições processam-se normalmente no tempo legalmente aprazado, para que quem está no poder não durma na forma, para que haja a necessária renovação, para que o rio político continue a seguir o seu curso normal com as águas devidamente arejadas, límpidas, cristalinas e puras. A vida dos homens e das suas instituições são como as águas. Se param, estagnam e, então, as poças transformam-se em charcos, os charcos em pântanos, os pântanos em lodaçal. Para manterem a limpidez, precisam de se renovar, de continuar o curso da mudança. E como as águas, assim os homens e as instituições. A vida de uma comunidade é como as árvores que precisam de ser podadas, renovadas, substituídas, para que os frutos continuem a ser abundantes e saudáveis.
Porque o que acima de tudo importa são os frutos.
É pelos frutos que as árvores se conhecem, reconhecem, se alimentam, se cortam, se podam, se racham, se lançam ao lume, se substituem por outras. Quem pouco ou nada deu, se alguma coisa deu mas já secou, deu o que deu, acabou. Há que renovar, para continuar a ter bons frutos.
E como para bom entendedor, meia palavra basta...por aqui me fico.
E como tomo os leitores por bons entendedores...prometo voltar com outros pontos de reflexão.
Agora, é a hora de bem entender e pensar, de bem escolher e votar.


Meio a rir...


Santanárias


Estamos tramados com isto!
O pêpêdocas Santana,
arma-se em vítima, em Cristo...
Não dá grão, só dá pragana.

Só ele é bom. Tudo o resto
não passa de escumalha.
Papagaio sem cabresto,
é só fumaça, só palha!

Ai Povo de Portugal,
velha pátria lusitana,
livra-te do lodaçal
preparado pelo Santana.

Pelo Santana, pelo Durão,
pelo Portas e a de Leite.
Muda já de direcção.
Elege quem te respeite.

O comandante és tu, Povo!
Eles só são mandatários!
Constrói tu um rumo novo!
Livra-te dos salafrários!

Os salafrários só querem
viver bem e sem canseira.
Por isso, a ti, preferem
quem lhes gabe a cabeleira.

Para eles o bom perfil
vale mais que as tuas dores.
Eles odeiam Abril!
Por ti não morrem de amores!

O voto é a arma do povo,
quando o povo está unido.
Só unido, meu bom povo.
nunca mais serás vencido!

Thursday, February 03, 2005

E meio a rir...

CARTAZES ELEIÇOEIROS

“Contra ventos e marés”
Contra tudo e contra todos
Dêem-lhe wisky, cafés,
Forrobodó, grandes bodos.

Às tantas, num cabaré,
Com um copo a mais no bucho,
“Este sim, sabe quem é”:
Um noctívago de luxo.

“Voto útil, com certeza!
É como um bom jaguar.
Para o próprio é uma beleza!
É só ganhar! Só ganhar!

“Voto útil”, pois então!
O que ele quer é poder.
E a pobre instituição?
A essa manda-a fundir,
A essa manda-a esquecer.
A essa manda-a afogar
Se acaso se faz ao mar
Na ânsia de abortar
Quem a anda e quer tramar,
E ainda se põe a rir.


“Mais votos na CDU
para (isto) mudar a sério”,
deve ser bom refrigério
para comichões no rabo.
Porque isto, ao fim e ao cabo,
Sei-o eu, sabe-lo tu,
Não passa de um bom chavão
Para enganar alentejanos
Que ao longo de muitos anos
Ouvem a mesma cassete.
Quando derem pelos enganos
Alçam o rabo do chão,
Preparam um bom cacete
Para correr com os maganos.



“Portugal vai ter um rumo”?
Oxalá! Não é sem tempo!
Mas que dure muito tempo!
Que não seja apenas fumo
Que se esvai como a fumaça
Que mal se vê logo passa
Que não chega a pegar fogo
Para aquecer corações
Que já sofrem de tensões
Acumuladas há muito.
Dizendo tudo por junto,
Quero dizer: apoiado!
Mudemos então a sorte.
O rumo certo é o Norte.
Eu já vejo tudo azul
Com as elites do Sul
A deixar amordaçados
Marcelos, Freitas, Rodrigues...
E antes que tu me obrigues,
Leitor, vou já concluir,
Meio a sério... meio a rir...
Com este velho recado:
Portugal desnorteado,
Mete os lulus no canil,
Retoma o rumo de Abril,
“Grândola, Vila Morena”
Que “o povo é quem mais ordena”
Quer se queira ou se não queira.
E que acabe de uma vez
E para sempre a brincadeira.
Viva o povo português!


André Moa

Wednesday, February 02, 2005

DEMOKRISIS

APRESENTAÇÃO

Há quem diga que a democracia está em crise. Há quem diga que a democracia sempre esteve em crise. Há quem diga que a democracia estará sempre em crise. Há quem diga que não há democracia sem crise. Se calhar, todos têm razão. Se calhar, a democracia está, sempre esteve e sempre estará em crise. Se calhar, a democracia é crise. Se calhar, sem crise não haverá nunca democracia. Se calhar, a democracia é uma fogueira, susceptível de aquecer os corações humanos. Se calhar, como qualquer fogo, a democracia apaga-se, arrefece e esfria sempre que não se atice o lume, sempre que não se rachem cavacos e se ponham a arder na lareira. Se calhar, todo e qualquer cidadão tem o direito, mas sobretudo a obrigação de alimentar a fogueira da democracia. Se calhar, é por isso, por uma questão de dever, que, no uso do meu direito de intervir, crio este blog que vou tentar ir alimentando, meio a sério... meio a rir, e assim ir lançando algumas achas para a fogueira. DEMOCRISE é a minha lareira onde todos se podem aquecer e contribuir para que o lume se não apague nunca, com o seu cavaquinho, com seriedade, se possível acompanhada de um sorriso franco e satisfeito, sem nunca dar o cavaco, sem enfado ou zanga, com bonomia e boa disposição, com vontade de acertar e de aceitar a opinião dos outros, desde que apresentada com lisura, frontalidade e recta intenção.
Avancemos, pois, que a democracia tarda.

MEIO A SÉRIO...

1. Demokracia - a raiz do mal.
2. Krisis - a raiz da crise.
3. Democrise - Democracia em crise. A crise da democracia.
4. Democrise - Artes do demo ou artimanhas dos diabretes da política?


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DEMOKRACIA – A RAIZ DO MAL


A culpa é dos gregos. Dos gregos helénicos. Dos gregos da Grécia antiga, que foi, ao que consta, a madre da democracia, que foi, pelos vistos, onde tudo começou. Foi aí que o mal (essa erva daninha a que deram o nome de DEMOKRACIA, e que nós hoje apelidamos, ufanamente, de democracia) surgiu, medrou e deu fruto. Fruto envenenado que ainda hoje nos obrigam a deglutir, para desespero da mais jubilosa e crédula esperança.
Se não fossem os gregos não haveria democracia e tudo continuaria, como dantes, em paz e sossego. Encontrar os culpados é o primeiro grande passo de toda a investigação que se preze, o indispensável passo para que se faça justiça. Condenem-se os culpados e tudo regressará à normalidade. À normalidade democrática, como convém. A quem? A quem dela beneficia, naturalmente. Mas quem é que dela beneficia? A coisa, assim, aperta, mas, muito sumariamente, poderá concluir-se que os mesmos de sempre. E aqui é que reside o busílis.
Mas voltemos à culpa e aos culpados – aos gregos e à Grécia.
A história diz-nos que os culpados foram os gregos, que inventaram a democracia , já lá vão mais ou menos cinco mil anos. Muito ruim deve ser a cepa que, regada e alimentada durante tanto tempo ainda não produziu frutos que valha a pena contemplar, provar e saborear.
Miremos, pois, a cepa. A democracia nasceu com o sedutor rótulo de Governo do povo. Como todos pertencemos a um povo, a democracia seria o poder, o governo de todos. Seria. Mas será? Logo no princípio, não foi. O conteúdo nunca condisse com o continente, nem o rótulo com a substância. A democracia nasceu e desde logo foi apenas para alguns. Na visão mais optimista, dela beneficiavam apenas quarenta mil. Há quem sustente que tão somente dez mil.
O grosso da coluna continuou escravo, servo, servidor, fora do sistema, abaixo do poder, subjugado ao poder, sob a pata do poder. A tirania continuou por muitas e más centenas de anos. Até na Grécia, a “pátria” da “democracia”. Os anos rolaram, com vozes que de vez em quando clamavam pela igualdade, pela dignidade de todos os homens, pela libertação dos oprimidos, mas que só eram ouvidas no deserto e cedo se viam amordaçadas nas masmorras, silenciadas a ferro e fogo nas praças, penduradas em alguma cruz para gáudio da canalha.


Muitos anos depois surgiu o NOVO MUNDO.
Depois de ensopado no sangue indígena e erguido à custa do trabalho escravo, eis que surgem vozes a apregoar as virtudes da democracia. Lincoln ousou mesmo aprofundar a designação de tão bendito sistema: “democracia, o poder do povo, pelo povo e para o povo”. E estava tudo dito. Estava e está. No dia em que tal acontecer, eu quero ver; e no local em que tal sistema se erguer, eu quero viver. Eu e a maioria absolutíssima dos homens e das mulheres. Resmungariam, como sempre, os tiranos, os dominadores, os privilegiados, os egoístas do poder ,como é fácil supor. Só que esses são uma minoria tão insignificante que o ranger deles não faria mossa. Mossa faz o seu poder, o poder imposto por tão poucos a tantos, em benefício de tão poucos, em prejuízo e com o sacrifício de tantos.



Não há dúvida que as aparências da democracia são vistosas, atraentes. A democracia regala o olho. À vista desarmada, seduz qualquer pessoa. O pior é passar do namoro ao casamento, do enamoramento à institucionalização, da teoria à prática, das ideias aos actos.
Um dia, entre duas charutadas, Churchil exalou a célebre baforada: a democracia não presta, mas não há outro regime melhor. Dentro do já experimentado pela humanidade, fácil será aceitar que não existe melhor regime do que uma democracia, apesar desta não prestar. Moral da história: à falta de melhor, usando as virtualidades do que não presta, haverá que pugnar por uma democracia que preste. No entanto, não poderemos esquecer nunca que, após múltiplas tentativas e experiências, depois de ensaiados vários tipos de democracia, esta continua a andar pelas ruas da amargura.
Porquê?
O que fazer?
Neste pequeno e despretensioso livrinho vou tentar responder a estas e outras questões, não através de grandes lucubrações intelectuais, mas tentando apenas evidenciar o óbvio, aplicando na explanação do tema a velha “teoria” do ovo de Colombo.
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KRISIS – A RAIZ DA CRISE



Krisis é a raiz da crise. A raiz etimológica, entenda-se, que a raiz da crise real, da crise concreta, da crise sentida no dia a dia, no quotidiano individual e colectivo, é mais funda e é múltipla.
Há crises boas, prenhes de esperança, capazes de mobilizar fraquezas e forças, revolver tripas, catapultar, demover céus e terra, remover montanhas, contornar obstáculos, aplanar vales, construir diques, aplanar caminhos, semear desertos, amainar tempestades, construir a bonança.
Há crises más que nos subjugam, nos arrastam para abismos insuspeitados, nos desalentam, crises que só uma boa crise, daquelas de colocar tudo em crise, a chamada crise de crescimento, a crise susceptível de remover montanhas, pode ultrapassar.
A democracia está em crise. Sempre esteve. Sempre estará. Crise boa ou má? Em meu entender má. Daí a necessidade de transformar a crise que vivemos, a má crise, a democrise, em crise democrática, vivificadora, criadora, redentora, susceptível de criar esperança.
Só esta determinação justifica o título e o conteúdo deste livro - DEMOCRISE.
Crise na democracia.
Porquê?
O que fazer?
Que surpresa nos poderá reservar a utilização da velha “teoria” do ovo de Colombo?
Pelo menos isto: pensar nela, na demococrise – na democracia e na crise – reflectir e descobrir o que todos já antevemos, mas não vemos, se calhar por causa dos véus, (talvez mais ajustadamente da areia) que os usurpadores do poder, os manipuladores das consciências, os monopolistas da democracia nos atiram para os olhos, para que não vejamos o óbvio, para que não exijamos de vez o que nos usurparam e tanto nos querem sonegar.
Por isso, mãos à obra. Por isso vos exorto, caros leitores, em primeiro lugar, à leitura deste manifesto, de olhos bem abertos, para que tudo seja visto, claramente visto. Não apenas o que aqui está escrito, mas principalmente o que, através do que está escrito, saibamos ler, consigamos ver, possamos alcançar. A seguir, tiremos as devidas conclusões para, então, agirmos em conformidade.



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DEMOCRISE

(DEMOCRACIA EM CRISE – A CRISE DA DEMOCRACIA)


A crise da democracia radica desde logo e essencialmente no facto de não dar a bota com a perdigota.
A bota é a forma, o modelo, a vasilha, a teoria, a definição. A mais utilizada e porventura a mais apetecida será a atribuída a Lincoln que define a democracia como o governo do povo, pelo povo e para o povo. Por isso, será a que vamos ter sempre em mente, como paradigma, como objectivo a atingir.
A perdigota é a cuspidela, o fogacho, a baboseira, o ditirambo, a prática, o que tem sido a democracia ao longo dos tempos, muito principalmente nos tempos mais recentes, no nosso tempo, uma vez que é aqui e agora que vivemos, é aqui e agora que nos devemos situar, é aqui e agora que podemos e devemos actuar.
Grande é a diferença entre o ser e o existir. Medonho é o fosso que separa a teoria da prática, as palavras dos actos, as boas intenções das boas acções, o discursos da praxis. Uma coisa é a areia que nos lançam para os olhos; outra coisa é aquilo que os salteadores do poder, depois de nos cegar ou tentar cegar, de nos amordaçar, para melhor se apoderarem dele fazem com esse poder de que, democraticamente, fomos usurpados. Mais ou menos descaradamente, mais ou menos com paninhos quentes, mais ou menos com pezinhos de lã, mais ou menos com o nosso beneplácito, a verdade é que acabamos por ser esbulhados do poder que, por definição, deveria ser de todos e exercido por todos, para bem de todos.
Como se dá o assalto e pratica o esbulho? De várias e desvairadas formas, a mais sofisticada e enganosa das quais é a chamada democracia representativa, considerada a mais democrática, mas a mais eficaz, alienante e esbulhadora, aquela que é perpetrada através de eleições gerais e secretas, a resultante do voto, da eleição de quem não conhecemos de todo, ou de quem apenas conhecemos a máscara, o discurso, a tal poeira atirada contra os olhos dos votantes.
Como a democracia tout court deu no que deu, há que adjectivá-la, para engodo dos que a sustentam no andor – o povo, os cidadãos, os eleitores. Daí o falar-se em democracia formal; democracia pluralista; democracia representativa; democracia participativa e até democracia popular que, dada a definição acima evidenciada, constituiria um pleonasmo, uma autêntica redundância, não fora o ela, a democracia tout court, nunca ter descido à àgora, nunca se ter firmado nos areópagos da governação, da política, da arte de bem governar a polis.


Norberto MacedoLembranças de Outono

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