DEMOKRISIS

A CRISE DA DEMOCRACIA

Monday, February 14, 2005

LÚCIA MORREU. A POLÍTICA TAMBÉM?

Lúcia morreu. Muito nova, coitada! Contava apenas 97 anos e 11 meses. Muito pouco tempo para quem viveu quase todo o tempo enclausurada. De vida normal teve apenas os primeiros 10 anos, e neles sofreu as agruras da pobreza, do baixo nível sócio-cultural em que nasceu, dos costumados e por vezes nefastos medos infantis: almas penadas a espreitar por detrás de cada penedo, ralhos celestes transformados em trovões, raios e coriscos e outros fenómenos naturais racionalmente incompreensíveis para quem crescia num ambiente rude, crente e inculto. Se tais fenómenos a surpreendiam no alto da serra onde guardava o parco rebanho da família, o pavor logo os transformava em insondáveis mistérios, visões, alucinações, interpretações delirantes que comungava com os seus primos mais novos.
Lúcia morreu. Vai nascer um novo mito, que a igreja não perde nenhuma oportunidade para criar ícones que sirvam de engodo para a pesca das pobres almas supersticiosas. Por isso, não tardará que seja beatificada e, logo, logo, santificada.
Se isto se passasse no cada vez mais restrito campo religioso, eclesiástico, o assunto não me mereceria sequer esta meia dúzia de linhas.
O inaceitável é ver os representantes de um país, constitucionalmente independente e laico, vergado à morte da quase centenária “vidente” de Fátima.
Santana Lopes e Paulo Portas, para quem a política não passa de uma permanente feira das suas vaidades, interromperam de imediato as acções da campanha eleitoral; o PS, mais comedido, interrompeu as acções de rua, as manifestações de festa; O BE e a CDU mostraram-se, parcimoniosamente condolentes. E eu pergunto: que pecados terão cometido, que maldades estariam a tramar Santana e Portas para, perante a morte, se ajoelharem, se mostrarem subitamente arrependidos? Que consideração lhes merece uma campanha eleitoral, para a interromperem assim? Uma campanha eleitoral é tão só um carnaval que choque com a morte de alguém? A política é ou não é uma coisa séria? Importa mais ser honesto, consciente, pedagogo ou hipócrita, fariseu, demagogo, sepulcro caiado por fora e pútrido por dentro?
Enterrem-se os mortos com o devido respeito, mas tratem-se os vivos com o necessário empenhamento, com o não menos devido respeito, com a indispensável atenção, estima e consideração.

8 Comments:

  • At 7:38 AM , Anonymous Anonymous said...

    Este interregno vai ser bom para curar gargantas e refazer poses dos sofredores desta Campanha! A Irmã Lúcia e a sua morte foi um pretexto aproveitável para refazer a forma de convencer o país a votar naqueles que não fazendo o que devem, o que prometem, servem-se das coisas do céu para adiar o inadiável, na terra. Enfim, eu diria como o Zézinho do sertão:
    "olha lá vai passando a procissão, se arrastando que nem cobra, pelo chão; as pessoas que nela vão passando, acreditam nas coisas lá do céu; as mulheres passando tiram lenço, os homens passando tira ó chapéu! Eles vivem penando aqui na terra, esperando o que o céu prometeu!"E como a Irmã Lúcia, velhinha simpática que até ia votar e tudo, não tem nada a ver com este "sertão" e como sou crente - mas a César o que é de César - espero que a sua alma descanse em paz.

     
  • At 10:15 AM , Anonymous Anonymous said...

    "Sousa Franco Morreu. A Politica também?". Até estou de acordo com o conteúdo do tema mas,...
    Para mortes iguais, porquê opiniões diferentes? Ou será que um era homem e a outra mulher e a igualdade dos direitos e deveres ainda não chegou aos comícios nem á política?

     
  • At 2:15 AM , Blogger Andre Moa said...

    Caro (a) comentarista, com toda a liberdade de expressão, agradeço o seu comentário e apenas direi que não manifestei a minha opinião (ainda não tinha este blog)quando da morte de Sousa Franco e que não tenho opinião diferente por morrer um homem ou uma mulher. Tenho para mim, isso sim, que a política é uma coisa séria e por isso compatível com a morte seja de quem for. Quanto mais significativa for a morte que acontece, mais nos deveria obrigar a zelar pela vida dos cidadãos a quem os políticos dizem (e deviam) servir. Com um abraço do André Moa

     
  • At 12:48 AM , Anonymous Anonymous said...

    Com todo o respeito, só posso dizer que este artigo foi muito, mesmo muito infeliz. Não no que concerne Santana e Portas, mas o autor deste artigo contradiz-se ao utilizar a morte da Sra. Lúcia (digo senhora e não Irmã para não haver interpretações de hipocrisia)para fazer política de oposição que foi o que os dois citados senhores fizeram. É apenas a minha modesta opinião. Talvêz eu esteja enganado e se estou, dou a mão à palmatória.
    Com os melhores cumprimentos.

     
  • At 3:08 AM , Blogger Andre Moa said...

    Não, caro comentarista, não está enganado, tem é uma interpretação muito sua que merece todo o respeito, porque formulada de boa fé e recta intenção, com base no seu sentir político e religioso. Por mim, apenas posso esclarecer o que pretendi dizer:1 - protestar contra a crendice e o aproveitamento da crendice;
    2 - desmascarar a hipocrisia dos "políticos" (leia-se politiqueiros) que se servem de tudo, até da crendice, para sacar votos,quando o que deviam era esclarecer correcta, serena e sinceramente do progrma, das suas rectas intenções de governar bem o país, com espírito de serviço e não por vaidade ou promoção pessoal;
    3 - a política assim servida é de tal maneira digna que não merece ser interrompida de forma tão farisaica, seja porque é carnaval, seja porque morreu uma senhora, freira ou não, "vidente" ou não. Com os meus respeitosos cumprimentos,
    André Moa

     
  • At 3:54 AM , Anonymous Anonymous said...

    Com todo o respeito que me merece a troca de galhardetes entre o Anonymous e o Blogger, acho que o que é preciso agora é que todos tomemos consciência que a politiqueirice tem que dar o lugar à verdadeira "arte de governar o povo", coisa que tem andado arredia do nosso País. Espero, sinceramente, que a partir do dia 20, se vislumbre uma perspectiva de luz ao fundo do túnel porque até agora agora só se tem visto um poço sem fundo!Espero que os pobres fiquem menos pobres e os ricos menos ricos, pois esse foi o espirito do 25 de Abril que tem vindo a morrer, lentamente, de um cancro feito de inépcia e falta de amor ao povo! Uma admiradora do blog Ana Catarina

     
  • At 7:52 AM , Anonymous Anonymous said...

    Eu costumo dizer que dou um boi para não entrar numa briga mas se entro, dou toda a boiada para não sair dela. Tenho achado interessante o pingue-pongue, se é que o anonymous é o mesmo ou seja a mesma pessoa que escreveu ambas as mensagens e acho que no fundo ambas as partes defendem a mesma opinião mas simplesmente com argumentos diferentes porque sinto que o objetivo político é idêntico talvêz diferenciado e aí não tenho certeza no capítulo religioso. Ambos defendem a mesma "ama" e não se deram conta.
    Gostei da mensagem da Ana Catarina tentando apaziguar. Não a conheço pessoalmente mas deve ser uma jovem que aprendeu o 25 de Abril nos bancos da escola onde continuam a esconder a verdadeira "identidade" deste Ilustre Senhor que se chamava 25 de Abril e que as mentes iluminadas dos nossos ditos políticos actuais internaram num hospital psiquiátrico. Cara Ana Catarina, hoje não se pode reaviver o 25 de Abril porque este morreu há já alguns anos devido ao "desleixo" da maioria dos actuais "milk boy's" da nossa política que como nada sabiam fazer na vida, os paizinhos os "meteram" p'ra lá para se ocuparem com algo mesmo que esse algo fosse depenar o país. Eu estou de total acordo que precisamos de um novo e "valente" 25 de Abril mas isso só se faz com Capitães e infelismente hoje não passamos de um país de "Magalas".
    Um abraço, mil desculpas e continua Moa.

    Suor do Xisto

     
  • At 6:51 AM , Anonymous Anonymous said...

    Vou responder ao post anterior até porque o pseudónimo é lindo! Uma bela pedra a suar pelo trabalho,é uma boa imagem do que Portugal precisa!É uma visão bastante poética mas real também! Pois é, acho que as considerações são reais mas eu continuo, ingenuamente a acreditar que ainda há Homens Bons, gente empenhada que não pensa, simplesmente, no vil metal e que haverá energias renovadoras que alimentarão aquilo que até agora quase parece utopia - a renovação mental desta país que eu amo e que precisa de deixar de estar "pela hora da morte! Para bem de todos nós. Fomos um país de vencedores porque é que passámos a ser de perdedores? É preciso reinstaurar a nossa auto-estima, usar a cabeça e deixar que o suor escorra pelo xisto e por todos os lados porque só a vontade e o trabalho mudarão as coisas.Um abraço Ana Catarina

     

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